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Thursday, October 31, 2002
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[ 83840662 ]
Lula Medalha de Ouro
Abro o site do Estadao prá me inteirar da transição Estocolmo-Leningrado e dou de cara com o Lula enrolado na bandeira nacional, com sorriso farto de menino. Vendo assim, na fotografia, me dá uma simpatia imensa por Lula. Dá vontade de amolecer os músculos da razão e entrar na onda do reeditado “tem que dar certo” do Sarney.
Nós, brasileiros, somos uns bobocas mesmos. Sempre procurando resgatar o sonho adolescente esquecido. Somos uns românticos incorrigíveis...
Ali
Fico sabendo que o filme Ali, interpretado por Will Smith, vai entrar em cartaz por aí. Vi aqui em NY há um tempo atrás. Uma frustração só. Quem assistiu When We Were Kings, o documentário sobre a luta do rei contra Foreman em 74 no Zaire, vai entender o porquê. Will Smith se esforça mas não convence. Caras como Ali mal cabem em si mesmo, tal o tamanho da personalidade. Não poderiam se encaixar no franzino Smith. Apesar do esforço geral pra se capturar os anos dourados do boxe e a dimensão do que Ali representou para a América, tão bem narrados por David Remnick, o chique editor da New Yorker, em The King of the World, o que se consegue é um punhado disperso de segundos de magia. Nada, porém, que te sapatei os hormônios. Smith deveria ter conversado mais com Ali. Faltou punch ao filme.
Páginas Frustadas
Se ao menos pudesse acompanhar em leitura a velocidade na compra dos livros...
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The guy behind a screen
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12:32 PM
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Wednesday, October 30, 2002
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[ 83787871 ]
Directions
Uma das coisas que demorei para (re)aprender por aqui é o tal dos pontos cardeais. Aquele, que no primário a gente recitava junto com o nome “rosa-dos-ventos”. A tal da rosa dos ventos, por pura infelicidade na escolha do nome, nunca se assimilou bem na cultura testosterônica brasileira e acabou ficando enterrada no nosso passado infantil, junto com o autorama e o velotrol. Faltou a ela marketeiro de primeira, que a salvasse do esquecimento e anacronismo.
Tive então que fazer um exercício de regressão pra voltar a utilizá-la aqui na América. Pontos cardeais são essenciais e imprescindíveis por aqui. Você mora em Dowtonw ou Uptown. No East Side, ou no West Side. Depois, se quiser, pode ser mais específico e informar ao indagador o nome do seu bairro. Mas primeiro, a etiqueta protestante manda que você situe o interlocutor.
No Brasil não. No Brasil a informalidade pede que se indique pelo nome do destino final, ou até mesmo, pelo apelido. Não há rodeios programáticos. É a cultura de pular o prefácio, de escapar à introdução. Vamos direto pro primeiro capítulo, quando não nos espatifamos no epílogo. Vamos pra “barra”, pro “jardins”, pra “vila mada”. Não tomamos norte ou sul. O destino final é o que conta. É a cultura da intimidade atropelante de se escapar ao aperto de mão. É o direto e certeiro beijinho molhado no rosto.
O problema no uso dos pontos cardeais, porém, é que vicia. Passamos a ter impressão que tudo tem rumo certo, tem que estar no norte ou no sul, no leste ou no oeste. O risco, a longo prazo, é a falsa impressão, que traz consigo associada, de que estamos livres das rotas erradas, das decisões equivocadas. Há vantagens, contudo. A auto-confiança e a soberba americana é prova disso.
Não estou bem certo, portanto, se o desprezo pelos pontos cardeais no contidiano nacional é omissão programada, embutida no “deixa pra lá, depois a gente acha”, ou tem raízes mais profundas. Somos uma nação de jazzistas, sempre improvisando o rumo a tomar. Não seria mal, porém, uma pitada de coordenadas aqui e alí, sobretudo aquelas de norte e sul. As de leste e oeste, e sua variante direita e esquerda, estas, estas já sabemos aonde vai dar...
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The guy behind a screen
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1:02 PM
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Tuesday, October 29, 2002
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[ 83739435 ]
Sem colarinho
Freddy Bilyk, o homem do 168horas, me deixa falando sozinho no MSN messenger sob alegação de que não podia perder o JN de hoje. A justificativa é das mais contundentes. Segundo ele, depois do plantão de ontem de Lula, provavelmente hoje o José Dirceu estaria tomando um choppinho com o Bonner. Por favor, quando saí daí Roberto Marinho era o diabo encarnado. Alguém pode me explicar o que está acontecendo?
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The guy behind a screen
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3:04 PM
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[ 83684648 ]
Folhas de Outono
Alheio aos gritos e sussuros da eleição brasileira, escapo ao meu dever cívico e à Manhattan e deixo a cidade no fim de semana. Vou para Connecticut, onde um amigo oferece a hospitalidade no pé das montanhas (Lakeville). Estamos na última semana antes que as folhas dêem seu suspiro final e pavimentem o chão de vermelho e amarelo. Não temos paisagem semelhante no Brasil. O meu encantamento, portanto, é de menino. No Brasil o processo sazonal é revolucionário. Vai do frio ao quente sem anunciar passagens intermediárias. É o inverso do processo político, sempre condescendente com o “homem cordial” brasileiro. Caminho assim pelas estradas que vão entrecortando esses cenários idílicos. Cruzo lagos e remansos, onde casas brancas de madeira anunciam, sem deixar dúvidas, a prosperidade da região. Em uma delas, sou informado que Merrill Streep é a feliz possuidora. Dá até para imaginá-la ao pé da lareira, colada num livro de poesia e fazendo cafunés no desapegado bichano.
A noite, vamos num desses restaurantes locais com lareira, onde a arquitetura, a decoração e o serviço trabalham em equipe para que se sinta entre amigos. A esticada final é uma festinha privada, onde os locais se esforçam para parecerem naturais diante da presença de Matt Damon, que joga conversa fora com os amigos, entre tragos de Beck e cigarros Marlboro.
Sob o céu azul do dia seguinte, o exagero dos bacons e ovos matinais indicam que uma caminhada pelo vilarejo é atividade bem vinda. Uma parada na livraria local se oferece e não resisto a arrematar a um exemplar da primeira edição de Rabbit Redux, de John Updike, que veio no ano do meu nascimento (1971). Caminha-se molemente pelo local e já passadas horas na região não se cansa de passear os olhos pela colorido quase fictício das folhas de outono. Tudo é calmo e ordenado, sugerindo uma perfeição irritantemente bem acabada. Há riqueza material e regramento social em cada canto. Passados 2 dias submerso neste universo, não é difícil entender porque esses caras cruzam o mundo em sua cruzada bélica pra preservar o tal do “american way of life”, o modus vivendi protestante. Fica fácil também engolir as palavras de Bush e o tal do “eixo do mal”, atribuído aos inimigos da corte. Pensando bem, em tais condições talvez fizéssemos o mesmo.
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The guy behind a screen
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2:44 PM
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Thursday, October 24, 2002
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[ 83482754 ]
O Lula sem o PT
A três dias de Lula realizar o seu sonho operário, só posso agora desejar sorte ao novo governo. Lula terá a felicidade de governar em paz pelos próximos 4 anos e tem nas mãos a grande chance de sua vida. Lula não tem como dar errado: não terá o PT na oposição...
No Lucro
Lula declarou esses dias que esta seria a semana mais longa de sua vida. Tá no lucro. Os próximos 4 anos serão os mais longos da minha.
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3:48 PM
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Wednesday, October 23, 2002
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[ 83415486 ]
Ato Falho
Os novaiorquinos andam meio macambuzios ultimamente. A razão é que o Corinthians do baseball deles, os Yankees, estão fora das finais. Sobre o assunto, vale aqui um comentário. O baseball americano é dividido em duas ligas, a American League e a National League. Eu sei, os nomes não ajudam ao esclarecimento do leitor desavisado. O fato é que um time então pode jogar na National ou na American League. A escolha é histórica e aleatória. Os campeões de cada liga enfrentam-se entao na....Country League? USA League? Mickey Mouse League? Errou, o nome é, pasmem, World Series (!!!), apesar de nenhum japonês ou venezuelano ter sido convidado. Puro ato falho dos conquistadores.
Entenderam agora os motivos do Osama?
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11:06 AM
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[ 83412713 ]
Uma nação sem reticências...
O que me irrita na América é essa resposta pronta pra tudo, essa certeza sobre o bem e o mal, esse juízo de valores sem vírgulas e interrogações. O que me irrita na América é a falta de reticências.
Temos tantas no Brasil...
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The guy behind a screen
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10:05 AM
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Tuesday, October 22, 2002
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[ 83361831 ]
We are closed
Meu querido amigo carioca, Marcus Gasparian, tenta me explicar o inexplicável sobre fechamento do comércio no Rio. Disse que teve que fechar sua livraria, a Argumento, porque os traficantes avisaram alguns lojistas que, se não fechassem, haveria represálias. No meio do arrastão de boataria, Marcus resolveu acatar as ordens de cima. Alguns lojistas, porém, desrespeitaram o sacerdócio e mantiveram as portas abertas, sem qualquer represália da chefia do morro. Conclusão melancólica e resignada do Marcus: no Brasil nem os bandidos cumprem a palavra.
Estado Comensal
Meu caríssimo e brilhante ex-professor, Paulo Sérgio Pinheiro, ficava uma arara quando diziam sobre a violência que havia um “Estado paralelo”. O raciocínio é simples: como a violência era perpetrada com a conivência e muitas vezes apoio policial, não havia de se falar em “Estado paralelo”, mas sim em “Estado comensal”. Naquela época Paulo Sérgio militava discreta e elegantemente na oposição acadêmica. Agora, Paulo Sérgio é Secretário de Estado dos Direitos Humanos de Fernando Henrique II. Pagaria em dólar para ouvir ele dizer o que pensa agora.
O Alienista
Bush, apesar de ridicularizado por aqui, tem aprovação de 60%. Todo mundo sabe que Bush só estudou em Yale porque teve o pistolão do Bush pai. Ninguém nega também que dá para aplicar o critério Lombrosiano em Bush (aquele, segundo qual os obtusos e os criminosos têm características físicas perceptíveis). Bushinho é conhecido por meter o sorvete na testa. Mas na hora do “get things done”, todo mundo dá carta branca a ele. É a cultura executiva americana, que prefere 100 vezes o trabalho realizado ao discurso sofisticado. É o inverso da cultura Padre Vieira do Brasil. Bush lembra o Dr. Simão Bacamarte, em “O Alienista”. Bush vai colocando uma a uma as nações que se opõe à política da Corte dentro do “eixo do mal”. Será que vai acabar, como o Dr. Bacamarte, se auto-encarcerando?
Entendendo as Mulheres
Todo dia pela manhã abro o New York Times e a primeira coisa que faço é colocar a seção de Sports na cara do lixo. Às vezes, quando, na noite anterior, via Serra subir nas pesquisas e estava em dias de maior esperança, dava uma checada no Sports pra ver se por algum milagre havia lá uma noticiazinha de futebol ou, pelo menos, de boxe. Invariavelmente, me decepcionava. Só se fala em basquete, baseball, golf e aquilo que eles praticam com a mão mas chamam de footbal. Depois de anos tentando, finalmente entendi a mente feminina...
O Polzonoff
Paulo Palzonoff continua a fina figura do mundo blog. Assim como Freddy Bilyk, merece visita diária. A novidade, é esse jovem rapaz, Daniel Lima, que não tem parentesco com o outro da mesma linhagem de talentos, Rafael Lima.
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The guy behind a screen
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11:24 AM
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Saturday, October 19, 2002
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[ 83230424 ]
Miséria Fabricada
Sempre preferi os ensaios aos romances. A razão é que me atrai mais a persuasão de uma idéia do que o marabalismo estético e estilístico. Não raro, horas de páginas precisam ser atravessadas até que um insight brilhante aconteça. Isso com os romances. Não, porém, com os ensaios. Estes, são enxurradas multicolores que te arrastam de um lado pro outro, sacolejando seus neurônios. Claro, assim como o romance, o ensaio precisa ser bom. Mas isso aqui é uma premissa. Há, evidentemente, muitas exceções a essa minha regra particular. A força de estilo de um Saramago, por exemplo, nem sequer precisaria de idéias. Mas lá elas estão, em cada esquina sem ponto de sua disssertação. O poder descritivo de um Proust não precisaria de nada mais além do que o arrastar do estilo, mas lá estão as idéias, enterradas entre seus adjetivos. Machado de Assis, com sua fina ironia, puntua aqui e ali seu olhar sobre o mundo, escondido nas frases soltas dos seus personagens.
É com isso em mente que cito uma passagem de Philip Roth, em The Dying Animal. Philip Roth pode ir pra turma acima, a dos autores ensaistas. Antes, porém, explico o contexto abaixo: o narrador está tentando convencer seu filho que ele não precisa assumir o bebê que sua namorada insisti em ter. Lá vai:
“(...) I reminded him that nobody could make him do what he didn’t want to do. I said that I whished some forceful man had said to me when I was on the brink of making my mistake. I said, ‘Living in a country like ours, whose key documents are about emancipation, all directed at garanteeing individual liberty, living in a free system that is basically indifirent to how you behave as long as the behaviour is lawful, the misery that comes your way is most likely to be self-generated. It would be another matter if you were living in Nazi-occupied Europe or in Communist-dominated Europe or in Mao Zedong’s China. There they manufacture the misery for you; you don’t have to take a single wrong step in order never to want to get up in the morning. But here, free of totalitarianism, a man like you has to provide himself his own misery. (...)”
Substitua o Estado totalitário acima pelo estado de violência em que se encontra o Brasil e a fórmula se encaixa perfeitamente. A miséria fabricada é o dilema do mundo desenvolvido. O Estado não fabrica pra você, você precisa fabricar a sua própria. O americano médio escapa da miséria mergulhando no consumo. O finlândes opta por enfrentá-la e termina mergulhando de cima da ponte. Nós, brasileiros, ainda não chegamos neste dilema. Estamos ainda nos debatendo no dia a dia, tentando escapar da miséria impingida. Ainda não declaramos nossa independência, ainda não fabricamos nossa própria miséria.
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5:12 PM
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Wednesday, October 16, 2002
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[ 83072860 ]
Noite Americana
Truffaut, o cineasta, tem um filme clássico com o título acima. A sacada é sobre uma trucagem no meio cinematográfico, inventada pelos americanos, na qual o dia é convertido em noite, mediante um joguete de luz, espelhos e etc. Não vou ousar a explicação senão apanho dos amigos do cinema. Pois na semana passada tive a minha versão de noite americana. Já no ínicio da noite, meu chefe, novaiorquino republicano, fiel devoto da empreitada nacionalista, me chama na sua sala, anunciando com entusiasmo juvenil que já estava com a tela da internet a postos. Bush faria um pronunciamento à nação. Pra completar o cardápio encomendado, pediu pizza pra quem quisesse acompanhá-lo no esperado speech de Bush. Do alto do 12o andar aqui na 3a avenida com a 42nd Street, faço minha lição de casa na dura tarefa sociológica. Durante meia hora, Bush, da tela do computador e entre minhas dentadas de muzzarela, falou à nação sobre Iraque, necessidade de ataque, “no fear”, etc., etc. No final, a ovação é geral. Coincidentemente, o discurso acaba com a pizza. Mas acho que não é coincidência, nem trocadilho. Aqui é cartel mesmo. Como disse meu amigo Martin, pra noite ser completa, ficou faltando só a Budweiser...
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11:11 AM
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Tuesday, October 15, 2002
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[ 83032301 ]
Curtas
Kafkaniano I
Leio que Maluf está apoiando Genoíno contra Alckmin. ACM apoia Lula, que também é apoiado por Delfim. Garotinho está com o PT e Sarney também lulou. Me sinto como Joseph K., o consagrado personagem de Kafka em “O Processo”. Tudo vai acontencendo a sua volta, a situação vai apertando, e, quanto mais o tempo passa, menos se entende.
Kafkaniano II
Meus amigos petistas gostavam de apredejar o FHC pelas amizades que este formou ao longo do Palácio do Planalto. Me pergunto: o tal do ditado, “diga-me com quem andas...” ainda está valendo ou agora já caducou?
Used books
Passo horas na Strand, a mais famosa livraria de usados em N.York. Fica pertinho da Union Square e, portanto, do lado da gigantesca Barnes & Noble da praça. Se passar por aqui, antes de torrar os dólares na B&N, atravesse a praça e vá até a Strand. Quer exemplos: How to Read and Why, Harold Bloom + American History, Paul Johnson + I married a Comunist, Philip Roth + Democracy in America, Tocqueville. Com tax incluída, a bagatela de U$ 37.00. Lembre-se da dica que dei no texto anterior. Não esqueça de pôr no testamento.
CEOs
Virou moda aqui nos EUA CEO ir pra cadeia. Há uma grande fanfarrice nisto, com espetáculos mediáticos de fulaninho tal sendo preso algemado, apesar de nunca ter matado periquito. O legalismo americano joga pesado e a mídia faz seu papel pirotécnico. Mas uma meia dúzia dessa choldra senda pega no Brasil faria bem, não faria?
O Franco-Atirador
Há notícias que costumo desprezar, pois faz parte do universo repetitivo do nosso cotidiano e costumam dar sono. Coisas do tipo “Beira-Mar foi preso”, “Escadinha ameaça delatar fulano”, ou agora, aqui na matriz, com o tal do franco-atirador (“sniper”), que já fez mais de 8 vítimas em Maryland. Mas não deixa de ser curioso que esse é o único país do mundo em que matadores não tem motivo aparente. Meu amigo americano retruca que somos um país muito mais violento. Como roupa suja se lava em casa, tenho que, num esforço imaginativo, contra-atacar: “O Brasil é um país de jogos mais autoritários, mas basta seguir a cartilha de não ostentação e você se livra da violência bestial. Nos EUA não. Você pode estar passeando com o cachorro numa bela manhã de sol e levar um tiro de um sniper. O Brasil pode ser autoritário, mas os EUA são totalitários.” Antes que ele reflita muito, fujo do assunto.
Red Dragon
Ontem foi Columbus Day, ele mesmo, o Descobridor, que o historicismo moderno quer enterrar, dizendo que nada foi descoberto. A lenga-lenga de sempre. Aproveito que não tenho nada a ver com essa história e toco pro cinema. O filme é Red Dragon, o terceiro, que se quer primeiro, da série Hannibal the Canibal. Saiu Clarice, Jude Foster e entrou (??), Edward Norton. O que mudou? Pouco. Norton é mais blasé e não paniquita na frente do Dr. Lechter. Foster suava frio. Havia também a simbologia e o jogo sedutivo de Lechter com sua prodígia da CIA, que com Norton foi enterrado. Ah, claro, Foster também tinha aquela história das lambs (ovelhas). Norton já superou os traumas de criança e deixou o filme mais raso. Columbus, se tivesse pêgo um cineminha, talvez escolhesse Norton. Aposto que não ia gostar nada nada dessas frescuras psicológicas. Não esqueçam, ele descobriu a América.
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2:28 PM
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[ 82939434 ]
Um Mar de Livros
Suponhamos que você está por volta dos trinta. Faz esporte, não fuma, come brócolis e renega, veementemente, a gordura da picanha. Além disso, e mais importante, sua família tem uma linhagem genética perfeita, de gente que andava atravessando a linha dos 80 com facilidade. Se você é dessa turma, tem boas chances de viver mais 50 anos. Agora vejamos. Você é um leitor compulsivo, devorador de jornais e periódicos semanais. Gosta dos nacionais e estrangeiros. Mas é também bom leitor de livros e consegue a marca fantástica de 1 por semana. Então vamos às contas: 4 por mês, 48 por ano, 480 em dez anos, 2.400 em 50 anos!
Se além do componente genético e da vida regrada, você ainda escapar da bala perdida, não dormir na direção, usar religiosamente os preservativos e, então, chegar são e salvo aos 80 e, no meio do caminho, não perder milhões de horas vendo novelas, mesas redondas esportivas, acompanhando o time do Santos, ou trabalhando para alguém, você meu caro, pode conseguir a marca histórica de ter lido 2.400 livros em sua vida.
Vamos agora ao seu custo educacional. Se está em território americano, admita a média de U$20.00 por livro, considerando que você não liga pros livros de capa dura. Pode fazer a conta em R$ 20,00 se preferir. Em 50 anos, seus 2.400 livros te consumirão $ 48.000, menos do que um MBA. Por ano, isso representa $ 960; por mês, $80; por dia, $ 2.66!! Ou seja, uma biblioteca de 2.400 livros durante uma vida dos 30 aos 80 lhe custará a atividade de toda manhã depositar $ 2.66 no seu cofrinho. Prá completar a tarefa, no final deixe no teu testamento pra ir para a biblioteca pública mais próxima.
O Lula, se eleito presidente, deveria adotar essa política e fazer a proposta para as elites. Em uma geração resolveria a falta de boas bibliotecas no país. Poderia até usar estilo próprio e chamar o projeto de o “Mutirão dos Livros”. Mas Lula tem que fazer por Medida Provisória, se não quiser deixar pro próximo presidente. E Lula não pode esquecer de, antes da polegada oficial, "carcá" lá na última linha: "Livro do Paulo Coelho não conta".
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5:19 PM
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Wednesday, October 09, 2002
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[ 82776175 ]
As botas de Outono
Veio tarde, mas o outono chegou em N. York. É a melhor época do ano. O céu fica cristalino, de um azul forte e vibrante e a temperatura vai para patamares civilizados. Não há como não gostar. A elegância dos trajes volta para as ruas, depois de surrada por quase dois meses de bermudões coloridos pelos turistas do meio-oeste americano. Longos casacos de couro, écharpes de cashmere, luvas de pelica e sobretudos de lã dominam a paisagem. Mas esse não é o melhor. O melhor, amigos, são as botas.
São as botas que pululam pouco a pouco as pernas novaiorquinas é que anunciam e dão o real charme do outono. Sinatra poderia ter cantado Autumn Boots. A maravilhosa troca de folhas do Central Park tem sua beleza, mas é apenas um joguete da natureza. As botas não, as botas são nossa escolha civilizatória.
Em geral elas vêm negras e de cano alto. Marcham firme e decididas. Pode-se vê-las, pode-se ouvi-las se aproximando. O som das botas femininas muda o som das calçadas e nossa percepção de tempo, anunciado agora pelo outono. E o andar militar das novaiorquinas encontra o seu par pefeito, nas botas.
Mas o mérito das botas vai além do acessório estético, do complemento funcional, da elegância impingida. Pois a bota traz a fantasia esquecida. Recolhe os atrevimentos de mau gosto, as combinações equivocadas, os pés não tratados, e fazem o corte democrático que as noites de verão não permitem. Transformam qualquer Jennifer em candidatas à estrelas hollyudianas. Marys, Ellens, Janes, no piscar de uma estação agora são todas potenciais Lauren Bacals, Cide Charisses, pelo simples desfilar de suas botas. É o milagre das botas!
Pois as botas escondem as imperfeções de canelas frustadas e, num passe de mágica, sugestionam o sucesso de coxas que se imaginam perfeitas. São meras sugestionadoras de nosso imaginário utópico, de nossa ilha da fantasia. Sem as botas estaríamos todos a mercê da realidade crua das canelas grossas e das coxas flácidas do dia a dia.
As botas, amigos, são a versão anímica e novaiorquina do nosso Duda Mendonça.
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9:36 PM
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[ 82655038 ]
Cores e sons de uma eleição
Quase terminada a apuração das eleições deste domingo no Brasil, fiquei com algumas impressões. Talvez a melhor de todas tenha sido o debate dos candidatos a presidente na última quinta-feira. Não pela profundidade, que não houve e nem poderia haver, em 2 horas de debate entre 4 candidatos, tratando dos mais diversos assuntos. O que impressiona é como o Brasil melhorou nos últimos 12 anos. Quem não se lembra da baixaria e precariedade de sons que se ouvia no começo da década de 90? Um pouco mais de 10 anos se passaram e parece que estamos em outro patamar. O que mudou? O exercício constante da gramática democrática muito ajudou. Mas é inegável que grande parte deste mérito deve ser dado a FHC. Fernando Henrique, ao se distanciar das caneladas do dia a dia político, deu ao cargo de presidente outra estatura. Quem o quiser agora vai ter que passar a bola com outro toque. Todos entenderam isto e o que se vê agora é uma disputa acirrada à la Paulo Roberto Falcão no meio campo. Todo mundo querendo passar de trivela. É bom pro espetáculo. É bom pro Brasil.
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Maluf, Collor e Quércia dizem adeus. Leio a notícia e me lembro daquelas conversas sobre cinema com os amigos, quando interrompemos o assunto por um instante, nos perguntando se determinado ator já morreu ou ainda anda por aí, fazendo papéis secundários em filmes de jovens celebridades como John Woo. No fim acabamos por descobrir que o dito cujo já se foi há mais de década.
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Lula talvez tenha jogado a chance pro ar da presidência por um mero detalhe. Se embananou com Garotinho, ao querer fazer crer que sabia do que estava falando quando respondeu à pergunta sobre a tal da “CID”. Mas o pior estava por vir. Prá fugir da alcunha de “homem não estudado”, tascou um “critério científico” ao indagado sobre as quotas destinadas a vagas para os negros nas universidades públicas. Seria perfeitamente perdoável ignorar a CID, no universo intransponível de tributos brasileiros. Mas não soou bem os “critérios científicos”. O “científico” virou contra o “cientificeiro”. O eleitor deve ter se perguntado como um candidato que pela quarta vez concorre à presidência da república e cuja agenda tem como prioridade temas sobre minorias raciais não tenha este assunto pronto pra ser regurgitado, sem titubear, ao menor movimento adversário. Definitivamente, não soou bem. Parafraseando o jazzista americano Duke Ellington, que alfinetou que “If it sounds good, it is good”, caberia aqui o inverso: “If it sounds bad ...”.
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Os jornais, nacionais e estrangeiros, gostam de dizer que os quase 50% de votos de Lula representam a negação do modelo econômico que está aí. Errado. Afora o repentino “centrismo” de Lula, basta olhar o debate de quinta-feira pra ver que o problema é outro. O que sobra em emoção e carisma em Lula falta a baciadas em Serra. Lula é vermelho sim, mas o problema é que Serra é cinza pálido.
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A melhor e mais séria revista do mundo, The Economist, estampa esta semana Lula na capa. Segundo meu amigo publisher Freddy Bilyk, fã antológico do periódico inglês, é a primeira vez em 159 anos de vida que um brasileiro ganha a primeira página sem ser acusado de nenhum crime. Lá dentro, o editorial se concentra em Lula. O sub-título explica porque a The Economist é o que é:
“Good for Latin American democracy. How good for Brazil?”
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Prá terminar a ressaca democrática, vão aí alguns dos resultados das eleições presidenciais brasileiras nas embaixadas no exterior:
EUA: Lula, 40.4%; Serra, 32.6%; Ciro, 17%; Garotinho, 9.4%.
França: Lula, 74.9%; Serra, 21.1%; Ciro, 2.3%; Zé Maria (?!), 1.8%.
Cuba: Lula, 83%; Serra, 9.0%; Ciro, 7.0%; Garotinho, 1.0%
Precisa dizer mais alguma coisa?
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2:23 PM
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Tuesday, October 01, 2002
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[ 82392054 ]
Lula não é Tony Blair
Estamos há apenas alguns dias das eleições no Brasil. Estou há mais de um ano morando em Nova York e vou acompanhando as notícias pelos jornais brasileiros via internet. Tenho uma visão a distância, portanto. Não sinto o clima eleitoral nas ruas nem aquele frenesi crescente que antecede as eleições no nosso país. Mas não preciso estar aí pra saber de algumas verdades: (i) a de que Lula está quase lá; (ii) de que Lula continua sendo o Lula, o líder do PT. Vou ao consulado e voto Serra, portanto.
Lula é correto. Não é homem corrupto nem acredito que seja corrompível. Tampouco creio que seja conivente com a corrupção. Em um país como o nosso, Lula, só por esse quesito, já é uma raridade. Lula também é um líder. Um homem que veio do zero, retirante nordestino semi-alfabetizado, vítima de todos os preconceitos de classe. Ainda assim superou tudo, tornando-se, talvez sem precedentes, um dos maiores líderes populares da história do nosso país.
Lula tem também carisma, requisito perigoso porém necessário. Político sem um mínimo de carisma cai no risco de, em momentos de crise, fragilizar a sua legitimidade. Há o reverso: o risco de se tornar excessivamente carismático e messiânico. Não precisamos de exemplos.
Lula tem ainda consciência da importância das instituições democráticas. Faz uso e abuso delas e não as questiona, embora às vezes não consiga refrear os ânimos bolchevistas de parte de seu partido. Lula tem também o mérito de ter evoluído e amadurecido suas idéias nos últimos anos. Compreendeu que pra governar um país precisa entender suas diferenças e idiossincrasias. Deixou o maniqueísmo petista de lado e arrefeceu as alas mais exaltadas. Jogo de marketing? Talvez, um pouco. Mas só isso já tem seu valor.
Por que então, Lula não merece ser eleito. Por um simples motivo: Lula não é Tony Blair.
Mas a razão não é porque o Brasil não seja a Inglaterra. Lula não é Tony Blair não porque faça comezinhos erros em sua língua natal, embora melhor seria que um presidente tivesse domínio seguro de sua própria língua. Não é tampouco Tony Blair pela semi-alfabetização, a origem humilde ou porque era torneiro mecânico. Ou ainda porque lhe falte certa elegância, que sobra em estadistas como Blair. Tudo isso é menos relevante e superficializa o debate. Não. Lula não é Tony Blair por que, ao contrário do líder do Partido Trabalhista inglês, não compreende o mundo em que vive, embora entenda o povo que lidera.
Os avanços que o PT e seu líder fez nos últimos anos não são suficientes pra governar nosso país. São avanços importantes, mas soam, no mais das vezes, como o neoliberalismo de Color: ocorreu porque era o tema da vez, não porque houvesse convicção sobre isto. Lula e o PT mantém ainda uma visão rudimentar da sociedade de mercado, são incapazes de entender que o capitalismo não é um inimigo a qual se possa lançar pedradas ou fazer passeatas e tem visão tacanha e dogmática sobre o sistema financeiro. Agem com imaturidade diante dos obstáculos e procuram personificar os problemas, como se eles fossem personificáveis.
Lula teve a coragem e audácia de estender a mão de apoio a um populista da pior espécie como Hugo Chavez (Venezuela), chamando-o de “democrata”. Apóia abertamente Fidel Castro, um ditador que não consegue livrar-se de si mesmo. Aplaude as piores atitudes de Bush, ao cumprimentá-lo pelas barreiras tarifárias impostas pelos EUA. Cala-se, quando não incentiva, ultimamente com certo comedimento, as ações criminosas dessa entidade intitulada MST. Opõe-se, de modo dogmático, às limitações das atividades do Estado.
É compreensível que um país que continua crescendo em números pífios, que não consegue resolver o problema da segurança e que ainda se debate com a miséria e o analfabetismo, haja um voto de protesto e esperança. Mas Lula não é a alternativa.
Lula não é alternativa porque não há alternativa. A alternativa é nada mais do que a perseguição desses mesmos objetivos que o governo Fernando Henrique plantou ao longo de seus dois mandatos. Fracassou em muitos. Mas todo mundo sabe a fórmula. A questão é implantá-la. A alternativa proposta pelo PT é um rompimento com o arcaísmo das intituições, com a mudança do discurso, com a ruptura do sistema. Mas o que é isso afinal?
Serra não é o candidato dos sonhos do tucanato. Não é também o candidato dos sonhos dos eleitores de Fernando Henrique. Falta-lhe carisma e paixão, qualidades de sobra em Lula. Mas Serra traz consigo problemas tópicos, Lula, utópicos.
O PT de Lula foi uma das maiores conquistas do processo político nacional das últimas décadas. Representou uma verdadeira oposição ao que há de mais sórdido na política brasileira. É, porém, uma oposição moral, abstrata. Opõe-se a valores, mas nunca funcionou no campo temático. O motivo é simples: não tem tema. O PT de Lula é a crítica, mas não é a obra. Os riscos da inversão desses papéis é o mesmo que corre a arte com crítico passando por artista: perdemos a obra e foi-se embora a crítica.
Há ainda outro fator. O PT de Lula foi incapaz de renovar sua liderança. Lula mudou, é verdade, mas a simbologia de sua liderança continua a mesma. O PT não forja novos líderes desde seu nascimento. Vai-se messianizando, se “vargalizando”, se “brizolando”. Tem atenuantes, é verdade, mas essencialmente mantém-se atrelado aos mesmos valores, aos mesmos equívocos. Nesse sentido, comete o mesmo erro da nossa elite, que num show de incompetência, foi incapaz de criar líderes. Não é à toa que a oposição mais recorrente ao PT seja Paulo Maluf, que sequer é um político, nem sequer representa as elites. Maluf é mera caricatura da própria política. É o eu em si mesmo.
É muito possível, porém, que ainda assim, Lula seja sufragado em primeiro turno no próximo dia 6. Se isso ocorrer, boa sorte a ele e a nós. Se, contudo, tivermos a chance de um segundo turno, seria bom pra Lula e para o país, que ele continuasse, com maestria, aonde sempre se colocou, em constante e eterna vigilância: na oposição.
E vamos às urnas.
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6:08 PM
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